Mulheres de líderes do PCC foram de pombos-correio a sócias no crime
Segundo a Polícia Federal, ela teria participado de um esquema que planejava uma fuga cinematográfica para o marido e outras lideranças.
Uma conversa de casal ganhou o noticiário e as redes sociais na última semana. No parlatório de uma penitenciária federal, o líder máximo do Primeiro Comando da Capital (PCC), Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, falava com a mulher, Cynthia Giglioli Herbas Camacho. Segundo a Polícia Federal, ela teria participado de um esquema que planejava uma fuga cinematográfica para o marido e outras lideranças.
Os investigadores enxergaram no contato uma troca de códigos que visava facilitar a fuga. O papel de mulheres de megatraficantes como um pombo-correio para o mundo externo é uma prática antiga que atende desde apelos por fugas a organizações de mercados criminosos no mundo externo. Nos últimos 20 anos, o papel dessas mulheres, porém, se expandiu e assumiu diferentes características, como a ligação com atividades de lavagem de dinheiro, apontam especialistas ao Estadão.
“O envolvimento de mulheres do PCC e das outras organizações criminosas também não é novidade”, disse o procurador de Justiça de São Paulo Márcio Christino, autor do livro Laços de Sangue, a História Secreta do PCC. Ele reconhece que as formas de atuação das chamadas primeiras-damas envolvidas no crime organizado passaram por alterações ao longo do tempo.
Nos anos 1990, quando a facção surgiu nos presídios paulistas, Christino aponta que era bem mais comum a atuação de mulheres como pombo-correio, até pelo maior grau de improvisação que se tinha na época. “Isso teve seu ápice logo na época da primeira operação contra o PCC, quando os líderes foram isolados (dentro dos presídios)”, afirmou o procurador.
Diante da limitação imposta a eles, mulheres de lideranças históricas da organização – como José Márcio Felício, o Geleião, e Augusto Roriz da Silva, o Cesinha – teriam passado a desempenhar também papéis centrais, o que foi crescendo por volta dos anos 2000.
Conforme Christino, mulheres de líderes do PCC constituíram “um núcleo da organização durante certo período de tempo”. “Elas eram consideradas como verdadeiras líderes fora do sistema prisional. A palavra delas representava um mando direto dos líderes, chegaram a gerenciar a organização criminosa naquele momento.”
TRANSFORMAÇÃO. O procurador explica que a atuação se transformou depois disso. A desembargadora do Tribunal de Justiça de São Paulo Ivana David destaca as funções financeiras e de gestão desempenhadas por elas nos últimos anos. “De lá para cá, a tecnologia foi mudando, o sistema prisional foi mudando. Os presos saíram das carcerárias das delegacias e foram levados para o interior. As mulheres também foram mudando sua atuação e cada vez mais ocupando cargos de maior relevância”, continua Ivana. “Hoje, a gente sabe que há mulheres que cuidam da parte financeira de células do PCC.”
Um experiente delegado da Polícia Civil de São Paulo, que investiga o PCC desde o fim dos anos 1990, destacou que o papel das mulheres das lideranças hoje passa pela gestão dos bens obtidos por meio de recursos do crime.
Ele, que preferiu não se identificar, explica ter comandado investigações que indicaram que as mulheres de lideranças chegaram a dar voz de execução em alguns casos e tomavam decisões por conta própria, principalmente no começo dos 2000. Com a estruturação da facção, o cenário mudou e elas migraram para outras funções.
RIO. O cenário não se restringe ao PCC. Danúbia de Souza Rangel, ex-mulher do traficante Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem da Rocinha, também ganhou o noticiário após ser acusada de coordenar o tráfico no morro após a prisão do marido. Irmã do traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, a advogada Alessandra Costa já foi acusada pela Polícia Federal de atuar na administração dos bens do megatraficante. Elas alegam inocência.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.