Lei que obriga síndico a notificar violência doméstica entra em vigor em SP
Com a nova lei, a expectativa é que ninguém fique omisso diante de casos de violência doméstica no local
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A lei que entra em vigor nesta segunda (15) coloca uma pá de cal na expressão “em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”. Isso porque síndicos que atuam no estado de São Paulo serão obrigados a comunicar aos órgãos de segurança os casos de violência doméstica ou familiar que ocorram em seus condomínios, sejam eles residenciais ou comerciais.
Isso significa que diante de qualquer indício de violência contra mulheres, crianças, adolescentes e idosos em áreas privadas ou comuns, os administradores devem atuar. Eles precisam fazer a comunicação durante a ocorrência ou em até 24 horas após sua ciência, levando à polícia o máximo de informações para a identificação da vítima e do agressor.
A nova lei obriga ainda os condomínios a fixarem comunicados divulgando as diretrizes e incentivando os moradores a notificarem a administração quando tomarem conhecimento de casos.
O texto frisa que não é necessário ter certeza de que está ocorrendo um episódio de violência doméstica para que a polícia seja acionada. Uma suspeita é suficiente para enviar uma comunicação por telefone ou aplicativo às delegacias especializadas ou órgãos de segurança.
No conjunto residencial Vila Belém, um condomínio de sete torres e cerca de 1.500 moradores na zona leste de São Paulo, acionar a polícia em casos de violência já era uma prática comum entre os sete subsíndicos, dentre eles seis mulheres e um homem.
“A mulherada domina aqui”, brinca Denise Maciel, síndica-geral do condomínio.
Com a nova lei, a expectativa é que ninguém fique omisso diante de casos de violência doméstica no local. Embora a legislação obrigue apenas os síndicos a reportarem as ocorrências, Maciel orientou moradores e funcionários a relatarem novos casos.
Antes mesmo de a lei entrar em vigor, a síndica-geral espalhou cartazes para alertar quanto à nova legislação. O condomínio vive um momento tranquilo, ela diz, e a expectativa é que esse seja um incentivo para que os ânimos continuem calmos.
Apesar de perceber como um avanço a obrigatoriedade ter se estendido a todos os condomínios, Maciel considera um problema as denúncias se concentrarem apenas nas mãos dos gestores. A síndica acredita que a responsabilidade de denunciar casos de violência doméstica é coletiva e, por isso, a lei deveria impor a mesma obrigação aos moradores e funcionários, uma vez que a denúncia pode ser anônima.
“Isso tem que ser um ato de qualquer pessoa. Sobra para a gente, mas todos deveriam ser conscientes de que todo mundo tem que ligar”, diz.
A lei foi proposta em março de 2020 pelo deputado estadual Professor Kenny (PP) e aprovada pela Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) em agosto deste ano.
O texto original previa sanções para os condomínios que não cumprissem as orientações. Na primeira infração, seria aplicada apenas uma advertência. Caso houvesse omissão pela segunda vez, haveria multa, de 50 a cem vezes o valor da Ufesp (Unidade Fiscal do Estado de São Paulo), ou seja, valores entre R$ 1.454,50 e R$ 2.909,00.
As penalidades, no entanto, foram vetadas pelo governador João Doria (PSDB) ao sancionar a lei, em 15 de setembro.
A legislação paulista é semelhante ao Projeto de Lei 2.510/20, proposto pelo senador Luiz do Carmo (MDB-GO), que já foi aprovado no Senado e remetido à Câmara dos Deputados.
A proposição também obriga os síndicos a comunicarem os casos de violência doméstica e familiar, mas estende aos moradores a responsabilidade legal de avisar os administradores caso tenham ciência de algum caso. A recomendação, no texto, é que façam denúncias anônimas.
Em caso de descumprimento, prevê o projeto que tramita no Congresso, o morador pode ser multado, assim como o síndico. Além disso, o administrador pode ser destituído do cargo.
Para Rodrigo Karpat, advogado imobiliário, especialista em condomínios, a ausência de uma sanção para aqueles que descumprirem a nova norma estadual dá à legislação um caráter educativo. “Se não existe a sanção, ela se torna uma lei apenas educativa”, afirma.
Mas, mesmo diante da ausência de penas previstas na lei paulista, o advogado diz que a omissão pode ser penalmente relevante e, por isso, os administradores devem fazer as denúncias diante de qualquer indício de violência.
“É melhor a pessoa fazer a denúncia acreditando que está diante de uma situação e não ser nada do que ser uma situação grave e não realizar a denúncia. Inclusive o síndico se expõe nesse caso”, resume Karpat.
Há um incômodo na categoria, porém, porque parte dos administradores entende que eles passam a assumir uma função que é do Estado, argumentando que se expõem ao realizarem denúncias ou intervirem em casos de violência.
O advogado explica, no entanto, que, ao ocupar a função de síndico, a pessoa assume a responsabilidade de gestão do local, e isso incluir também determinados cuidados dentro das casas das pessoas, como esses agora previstos em lei.
“A lei deve ser cumprida independentemente de sanção, mesmo que de forma educativa. O síndico deve ter uma interferência mínima na vida pessoal, mas tendo indícios de violência doméstica deve efetuar a denúncia para os órgãos responsáveis”, conclui.
Dicas de especialistas para síndicos diante ocorrências Se houver indícios de violência doméstica, acione a polícia Não deixe de espalhar as comunicações no local, como manda a nova lei Não entre na unidade nem se envolva fisicamente em caso de brigas ou discussões Os instrumentos de repressão do condomínio devem ser aplicar a multa, reaplicar a multa se necessário, dar advertência, notificar ou interfonar para a unidade É recomendado ter uma assessoria jurídica para o local