Lira usa emendas e reação à Lava Jato para se consolidar e ser favorito até sob Lula

Articulador do centrão, Lira tem como maior trunfo o controle sobre a distribuição de bilionárias verbas das emendas parlamentares

Lira usa emendas e reação à Lava Jato para se consolidar e ser favorito até sob Lula

RANIER BRAGON E DANIELLE BRANT
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Principal aliado de Jair Bolsonaro (sem partido) no Legislativo, o deputado federal Arthur Lira (PP-AL) é apontado por governistas e opositores, por ora, como o favorito para vencer a disputa de fevereiro de 2023 e seguir no comando da Câmara, mesmo sob um possível terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Articulador do centrão, Lira tem como maior trunfo o controle sobre a distribuição de bilionárias verbas das emendas parlamentares. Além disso, lidera ao lado da oposição a reação do mundo político à Lava Jato.

A avaliação de parlamentares aliados e da oposição é a de que, a não ser que haja uma reconfiguração relevante de poder das bancadas nas eleições de 2022, o centrão continuará tendo papel fundamental no Congresso, independentemente de quem seja eleito para a Presidência da República.

E, dentro do centrão ou fora dele, não há hoje nome que rivalize com Lira, cuja candidatura à reeleição é tida como certa no mundo político.
O deputado do PP foi eleito em fevereiro deste ano com o apoio de Bolsonaro. Em sua gestão, centralizou em torno de si a distribuição a deputados das emendas parlamentares a cargo do relator-geral do Orçamento.

Diferentemente das emendas individuais e coletivas, cuja distribuição é igualitária e a execução, obrigatória, as emendas de relator (que têm a rubrica RP-9) são divididas mediante critérios políticos e muito pouco transparentes.

Elas passaram a valer em 2020. Naquele ano, foram R$ 20 bilhões. Em 2021, ficaram em R$ 16,8 bilhões. O valor para o ano que vem ainda não está definido. A previsão atual é de R$ 16 bilhões, mas o centrão trabalha para inflar a rubrica.

“Lira é o favorito porque controla um orçamento de R$ 11 bilhões [a RP-9 é dividida entre Câmara e Senado] de investimento. Nenhum candidato a presidente tem esse cacife. É loucura enfrentar”, afirma Elmar Nascimento (DEM-BA), segundo quem esse favoritismo se dará sob Bolsonaro, Lula ou qualquer outro vencedor da disputa em 2022.
De acordo com a última pesquisa do Datafolha, de setembro, Lula lidera a corrida presidencial com 44% das intenções de voto. Bolsonaro tem 26%.

“O presidente eleito em 2022 vai conviver com ele [Lira] por pelo menos 30 dias [a posse presidencial é em 1º de janeiro de 2023. A eleição na Câmara é em 1º de fevereiro]. Então, é melhor sentar e ajustar do que enfrentar. Nenhum candidato de direita ou de esquerda terá maioria na eleição da Câmara. Será um candidato do centro, que é onde ele [Lira] opera e tem muita força”, diz Elmar.

Com o poder de distribuição e também de liberação, devido à influência no Executivo -o ministro da Casa Civil é Ciro Nogueira (PI), presidente licenciado do PP-, Lira formou não só uma base suprapartidária de apoio na Câmara.
O dinheiro das emendas é um dos principais combustíveis usados nas campanhas de deputados à reeleição, pois ajuda a irrigar suas bases com obras de infraestrutura e outros benefícios.

Ou seja, Lira possivelmente terá ao seu lado a fidelidade de um pelotão de parlamentares reeleitos, em boa medida, graças a ele.

“Não tenho dúvida de que o Arthur vai ser um grande eleitor para muita gente no ano que vem. E nada leva a crer que a bancada do PP vá recuar. Não tenho a menor dúvida de que ele é favorito”, diz o deputado Orlando Silva (PC do B-SP). “Ele larga na frente, qualquer que seja o resultado da eleição presidencial.”

Procurado por meio de sua assessoria, Lira não se manifestou.
O arco de apoio em torno do presidente da Câmara lembra a estratégia implementada por Eduardo Cunha (MDB-RJ). O emedebista recriou o centrão (outro grupo com o mesmo nome atuou no Congresso durante a Constituinte) sob seu entorno em 2014.

Os principais partidos, além do MDB, eram PP, PR (atual PL) e PTB. Cunha, então líder do MDB, ajudou a eleger deputados de vários partidos em 2014 ao distribuir doações empresariais entre eles.

Em sua fracassada tentativa de fechar um acordo de delação na Lava Jato, o emedebista disse ter arrecadado R$ 270 milhões em um período de cinco anos para repartir com correligionários e aliados, sendo 70% via caixa dois.
Com o apoio angariado, Cunha derrotou o candidato do Palácio do Planalto em 2015 e se elegeu presidente da Câmara. Ele foi um dos artífices do impeachment de Dilma Rousseff (PT), no ano seguinte, mas acabou afastado do cargo e do mandato pelo Supremo Tribunal Federal em meio às investigações da Lava Jato.

Cassado pela Câmara, Cunha foi preso em outubro de 2016. Em maio deste ano ele obteve o direito de responder em liberdade a acusações que ainda tramitam na Justiça.

Apesar da proximidade com Bolsonaro, Lira é considerado favorito também por integrantes da oposição, incluindo deputados do PT, que afirmam ser possível -alguns falam o termo “provável”– um eventual governo Lula apoiar a reeleição do atual presidente da Câmara.

“Não vejo na oposição nome que possa agregar. Ainda é muito cedo, mas acho que ele é favorito, não tenho dúvida nenhuma disso, independentemente de quem vença a eleição para presidente”, diz o deputado Julio Delgado (PSB-MG).

Ele lembra que os partidos que compõem o centrão têm histórico de governismo, à direita e à esquerda. “Não tenho dúvida de que fatalmente o PP vai fazer parte da base do futuro governo.”

Embora esteja no grupo político contrário do de Lira, a oposição caminhou lado a lado com o presidente da Câmara em algumas pautas, especialmente aquelas usadas para retaliação à Lava Jato -Lula ficou preso 580 dias em decorrência de condenação oriunda da operação- e blindagem ao mundo político.

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