Vegetação nativa de são Francisco de Itabapoana

No alto e médio curso, o rio Paraíba do Sul corre num vale formado pelas Serras do Mar e da Mantiqueira. No seu trecho final, esse vale se alarga a tal ponto que o observador postado na Serra da Mantiqueira não consegue mais avistar a Serra do Mar e vice-versa. O rio funciona como uma espécie de barreira ou de divisor de formações vegetais nativas, fenômeno observado por Jorge Pedro Pereira Carauta e Elizabeth de Souza Ferreira da Rocha (“Conservação da flora no trecho fluminense da bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul”. Albertoa nº 11. Rio de Janeiro: FEEMA, 1988).

No norte fluminense, a Serra do Mar sofre um rebaixamento abrupto por onde os rios Paraíba do Sul e Muriaé puderam passar e construir, dentro de uma baía semiaberta, a grande planície fluviomarinha dos Goitacás. Na margem esquerda de ambos, ela volta a se altear pouco a pouco até tornar-se contínua de novo no Espírito Santo. Na margem direita do rio Paraíba do Sul, do alto da Serra do Mar até a costa, encontramos, nos pontos mais elevados, os campos de altitude do Desengano e do Frade, a floresta perene de encosta (ombrófila densa), os campos nativos de planície e a vegetação das lagoas (de influência fluvial), as matas higrófilas (nos pontos elevados da planície), a vegetação de restinga (de influência marinha) e os manguezais (de influência fluviomarinha).

Brejo em São Francisco de Itabapoana ladeado por matas estacionais semideciduais
Acompanhando Henrique Pimenta Veloso, Antonio Lourenço Rosa Rangel Filho e Jorge Carlos Alves Lima (Classificação da vegetação brasileira, adaptada a um sistema universal. Rio de Janeiro: IBGE, 1991), todos estes tipos de vegetação, em torno do eixo Serra do Mar-Serra da Mantiqueira, formam o Domínio Atlântico, antes conhecido apenas pela denominação de Mata Atlântica. Porém, na margem esquerda, da costa sanfranscicana até a Zona da Mata, dominava, no passado, um tipo de floresta classificado atualmente com o nome de mata estacional, também integrante do Domínio Atlântico. O adjetivo estacional significa que esta floresta sofre influência das estações do ano, perdendo as árvores folhas durante a estiagem. Se a perda de folhas fica entre 20 e 50%, ela é considerada estacional semidecidual. Caso a perda ultrapasse 50%, a floresta passa a estacional decidual. Em 1500, 100% da cobertura vegetal nativa, na margem esquerda do rio Paraíba do Sul, no noroeste fluminense, eram constituídos por florestas estacionais semideciduais.

É de se perguntar por que este tipo de mata dominava toda a extensão do noroeste fluminense, da zona serrana até os tabuleiros, beirando o mar. A explicação mais plausível fornecida pelos cientistas mostra que, da costa para o interior, até os contrafortes da Serra da Mantiqueira, não existem, no noroeste fluminense, grandes elevações. Assim, as nuvens que se formam pela evaporação da água do mar são empurradas pelo vento nordeste, dominante na região, para o continente. Não encontrando barreiras que provoquem seu resfriamento e precipitação na forma de chuva antes da Mantiqueira, elas passam pelo noroeste, onde a queda de chuvas é reduzida quando comparada com a pluviosidade da Serra do Mar, no norte fluminense. Assim, a menor umidade do noroeste fluminense exigiu da mata atlântica uma adaptação que favoreceu o desenvolvimento de árvores como o pau-brasil, o jequitibá, o gonçalo-alves, a peroba-de-Campos, o jatobá, a cana-fístula e o óleo-vermelho, principalmente.

Aspecto de floresta estacional semidecidual

Embora sujeito à perda de folhas na estação da estiagem, este tipo de floresta apresenta porte majestoso. Foi ela que maravilhou o príncipe naturalista alemão Maximiliano de Wied-Neuwied em São Fidélis (onde as chamou românticas florestas) e em São Francisco de Itabapoana, em 1815, a caminho para o Espírito Santo, em sua excursão científica entre Rio de Janeiro e Salvador. Pouco depois, em 1818, o botânico francês Auguste de Saint-Hilaire mergulhou nela na altura da praia de Manguinhos e só a deixou na fazenda Muribeca, às margens do rio Itabapoana. Continuando sua excursão pelo Espírito Santo junto à costa, registrou sua presença ameaçadora acompanhando o litoral, pois nela habitavam os temíveis índios puris. Johann Jacob Tschudi, naturalista e diplomata suíço, informou sobre sua destruição por fogo provavelmente no atual território de São Francisco de Itabapoana, e o estudioso alemão Hermann Burmeister, extasiado, comparou-a às catedrais góticas, subindo o rio Pomba em direção a Minas Gerais. Ambos em meados do século XIX.

Este o tipo de vegetação nativa que reinava soberano no antigo sertão de São João da Barra, chamado, já no século XVIII, de Sertão das Cacimbas, era célebre por suas imponentes árvores. Delas, deu notícia, em 1785, o capitão de infantaria cartógrafo Manoel Martins do Couto Reis, exaltando a qualidade das madeiras nobres de São Francisco. Para facilitar seu transporte, foi aberto o canal de Cacimbas, que começava no rio Paraíba do Sul e se estendia até a e extinta lagoa de Macabu. No próximo artigo, abordaremos a vegetação de restinga e os manguezais.  

É de se perguntar por que este tipo de mata dominava toda a extensão do noroeste fluminense, da zona serrana até os tabuleiros, beirando o mar. A explicação mais plausível fornecida pelos cientistas mostra que, da costa para o interior, até os contrafortes da Serra da Mantiqueira, não existem, no noroeste fluminense, grandes elevações. Assim, as nuvens que se formam pela evaporação da água do mar são empurradas pelo vento nordeste, dominante na região, para o continente. Não encontrando barreiras que provoquem seu resfriamento e precipitação na forma de chuva antes da Mantiqueira, elas passam pelo noroeste, onde a queda de chuvas é reduzida quando comparada com a pluviosidade da Serra do Mar, no norte fluminense. Assim, a menor umidade do noroeste fluminense exigiu da mata atlântica uma adaptação que favoreceu o desenvolvimento de árvores como o pau-brasil, o jequitibá, o gonçalo-alves, a peroba-de-Campos, o jatobá, a cana-fístula e o óleo-vermelho, principalmente.

Exemplo de peroba-de-Campos

Por: Arthur Soffiati

Historiador com doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro, colaborador com a imprensa e autor de 26 livros.

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