Morreu, aos 65 anos, o artista plástico campista João de Oliveira nesta segunda-feira (24)

Genilson Pessanha
O artista plástico campista João de Oliveira morreu, aos 65 anos, nesta segunda-feira (24). Ele estava internado na UTI do Hospital Dr. Beda II, onde fazia hemodiálise. Em fevereiro do ano passado, João chegou a abrir seu próprio espaço, denominado Petit Galerie, onde expôs quadros que compõem uma retrospectiva da sua obra, iniciada no final dos anos 1960. Ao longo desse tempo, ele já expôs seus trabalhos em várias cidades brasileiras e no exterior, em países como França, Alemanha, Inglaterra e Itália. Sua primeira exposição foi realizada em 1968. João era casado com Cláudia Oliveira e deixa o filho Uno de Oliveira, integrante da equipe de design gráfico da TV Globo. O velório acontece no Palácio da Cultura, onde três quatros do artista foram colocados pela Fundação Jornalista Oswaldo Lima, datados de 1981 e 1990. Já o sepultamento está marcado para a manhã desta terça-feira (25), no cemitério Campo da Paz.
— É um momento bem difícil — afirmou o filho de João. — Eu estava em Campos, ainda consegui passar um tempo final com ele, para conversar as últimas coisas. Ainda deu tempo de a gente brincar, falei que o Fluminense perdeu para o Flamengo. Ele, ainda lúcido, conseguiu entender e brincar comigo, muito espirituoso até o último momento. É uma perda muito difícil, estou me equilibrando. Mas, é isso, acho que a vida é feita de momentos. Chegou o momento dele. O legado que ele deixou, tudo o que ele criou faz muito sentido. Um sentido muito relevante para a cultura da cidade e do Brasil. Me inspiro muito nele até hoje, sempre foi o meu foco. Que seja um momento de alegria, como ele sempre foi — enfatizou Unio.

 

Arquiteto que sempre se dedicou às artes plásticas, João de Oliveira se tornou artista plástico e programador visual de grande reconhecimento profissional em Campos. Ele ficou conhecido como “João do Índio” devido ao sucesso da sua exposição de quadros intitulada “Índios”, que retratava toda a essência indígena. Levada para várias cidades, entre elas Rio de Janeiro e Brasília, “Índios” ganhou o mundo depois de uma exposição no Hotel Copacabana Palace, na Galeria Place des Arts, levando o campista para uma exposição em Londres, na Marsham Gallery, em 1985.

Em 1980, depois de ter participado de mostras de arte no Rio, foi convidado a fazer sua primeira exposição individual em Campos, no Palácio da Cultura. Nesta época, fazia uma pesquisa minuciosa sobre o índio brasileiro, e daí surgiu uma exposição em que ele retratava os índios com toda sua beleza, inocência e espiritualidade. Com o sucesso, realizou, só em Campos, exposições individuais com essa temática nos anos de 1980, 1981, 1983, 1984 e 1987.
Em 1994, João fez uma exposição na Caixa Econômica intitulada “Espelhos”, onde várias imagens de Campos apareciam refletidas sobre o rio Paraíba. Foi considerada a primeira exposição no município com recursos de computador aliados a efeitos de Air-Brush. Realizou, também, várias exposições com outros temas. Em 1996, foi convidado a expor no Free Jazz do Museu de Arte Moderna do Rio. Apaixonado pela música, João de Oliveira desenvolveu 28 quadros sobre o tema.
De lá para cá, foram muitas obras e exposições em seu currículo, sendo apontado como um dos maiores artistas da cidade, tendo já exposto por duas vezes no Salão de Artes Contemporâneas do Museu do Louvre, em Paris, mais conhecido como “Carrousel du Louvre”.
Bastante engajado com a cultura de modo geral, João fortaleceu em 2018 o movimento “Valorize o artista da terra”. “É importante valorizar a arte de Campos, incentivar os artistas em todos os sentidos. Não só das artes plásticas, como no teatro, na leitura. Eu estou nesse movimento para que haja um reconhecimento maior dos artistas da terra”, declarou à Folha na ocasião.
 
Amigos lamentam a morte de João de Oliveira
Em nota, a presidente da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, Auxiliadora Freitas, lembrou da trajetória do artista plásticos, que nasceu no distrito de Tocos. “João foi um gênio da nossa arte, sempre nos surpreendendo com tudo aquilo que produzia. Nosso artista realizou, em 2013, uma temporada de exposições em Spoleto, na Itália; no Carrousel du Louvre – Museu du Louvre, em Paris, e na Galeria Wesel, na Alemanha. Nossa missão é continuar divulgando e valorizando sua arte, para que as futuras gerações sigam admirando sua arte”, disse. 
A pesquisadora e diretora do Museu Histórico de Campos, Graziela Escocard, também lamentou a morte. “Perdemos um grande artista plástico campista, que sempre imprimiu nossas raízes em suas obras. Toda exposição do João no Museu Histórico de Campos era um desafio, por ele sempre se inovar. Que boas lembranças possuo das nossas montagens de exposição. João se foi cheio de projetos”, comentou.
Planos do artista também foram lembrados pela historiadora e diretora do Arquivo Público Municipal, Rafaela Machado: “É uma perda muito sentida. João estava cheio de planos, cheio de projetos. Nos reunimos há dois meses para falar sobre a ideia dele de uma grande obra sobre os Goitacá. Que o talento dele seja sempre lembrado”, declarou..
O também artista plástico Adriano Ferraioli falou sobre os talentos do amigo. “João de Oliveira, em sua passagem, apenas reafirma seu nome como um dos maiores expoentes e representantes da cultura campista. Talento inquestionável e personalidade impar. Imprimia em sua arte todo sua emoção e estilo. Experimental, meticuloso, criativo e competente, encantava a todos com suas obras, dizendo sempre que a sua inspiração vinha da transpiração. Porém, o que eu mais admirava em sua trajetória profissional era a sua corajosa opção de viver exclusivamente da arte e por ela. Sempre que estávamos juntos, eram encontros descontraídos e com muitas risadas. Ficam o respeito, a admiração e meus profundos sentimentos para a família do nosso querido artista”, lamentou.
O jornalista Fernando Leite também comentou a morte de João. “Que tristeza mais funda, desnecessária. Logo você, que é disparado o mais talentoso artista plástico de sua geração. O que andou por terras mais distantes, levou seus índios ao museu do Louvre, e nem por isso perdeu aquele jeito bonachão, campista, boulevardiano de ser. Não tem duas semanas, nos falamos pela rede e você me encantou com a proposta de fazermos um trabalho em dupla. E agora, o que eu faço com aquela alegria que você acendeu em mim? A morte é, irremediavelmente, estúpida, inoportuna”, publicou em rede social.
Outro amigo de João de Oliveira, o jornalista Antônio Filho disse que o povo campista deve se orgulhar da obra do artista, que elevou o nome da cidade no exterior. “Tive a honra de conviver com João, acompanhando algumas das suas exposições no foyer do Teatro Municipal Trianon, nas quais pude presenciar a dedicação com a qual ele cuidava das suas obras, preocupado em oferecer os melhores campos de visão aos visitantes. Seus índios, maravilhosamente retratados, jamais serão esquecidos”, enfatizou.
O trabalho de pesquisa feito por João Oliveira para abordar a temática indígena foi valorizado pelo historiador e ambientalista Aristides Arthur Soffiati. “De fato, o João de Oliveira foi um pintor que marcou a cultura de Campos. OSe destacou pelo tema escolhido, buscando retratar o nativo, o índio goitacá principalmente. Ele fez pesquisa para chegar, mais ou menos, a uma ideia de como teria sido esse índio.  O que ele criou em termos de pintura dos índios, as pessoas podem até dizer que é uma pintura figurativa e decorativa, embora eu acho que não seja. Acho que o que ele mostra, e que é o mais importante, é o índio na sua dignidade. Foi isso que escrevi para uma apresentação que ele fez na Fundação Cultural, na década de 1980. João retrata o índio com uma dignidade que não existe mais. Portanto, ele buscou o índio nas suas origens”, salientou.
Um quadro de arte em terceira dimensão assinado por João de Oliveira pode ser visto no hall de entrada da sede da Folha da Manhã, como destacado pela diretora-presidente do Grupo Folha, Diva Abreu Barbosa.
— Ele era um artista da nossa cidade de grande talento, que cresceu não só em nossos limites, chegando a Rio de Janeiro, São Paulo e até Paris. Um artista muito competente, muito criativo, que foi denominado João do Índio por ter se especializado em fazer quadros com esta temática. Foi uma marca. Que bom que ele prestigiou os donos de nossa terra, porque, na verdade, os invasores somos nós. Essa reverência ao índio é de um simbolismo muito forte, que mostra não só o talento, como toda a sensibilidade de João. E a Folha recebeu, generosamente, um quadro de terceira dimensão feito por ele, que engrandece nosso hall de entrada. Sentimos muito a sua partida. Mas, com certeza, ele está fazendo alguma festa com os índios, com os nossos antepassados, lá no céu — afirmou Diva.
 
Folha 1
RANOTÍCIAS

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