Técnico de enfermagem se acorrenta à porta do Albert Schweitzer em protesto contra crise na saúde

André Luiz Prazeres, ex-técnico de enfermagem do Hospital Albert Schweitzer, se acorrenta à porta da unidade

André Luiz Prazeres, ex-técnico de enfermagem do Hospital Albert Schweitzer, se acorrenta à porta da unidade Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo
Em protesto contra a crise na Saúde do Rio, o técnico de enfermagem André Luiz Prazeres Almeida se acorrentou na entrada do Hospital municipal Albert Schweitzer, em Realengo, na Zona Oeste. Almeida disse que foi demitido após divulgar as péssimas condições da unidade. Ele diz que só sairá dali após a Prefeitura do Rio legalizar a situação dos funcionários. Com um jaleco branco escrito frases como: “SOS Saúde SUS”, “Fora OS” e “Justiça já”, Almeida conta que foi dispensado da Organização Social (OS) Cruz Vermelha, do Rio Grande do Sul, que administra a Unidade de saúde:

— Estou aqui não só por mim, mas também pelos meus colegas. Eles trocam as OSs e quem paga a conta são os funcionários e pacientes. Há meses estamos sem receber. Há meses o hospital não tem estrutura básica. Falta tudo — afirma Almeida, de 49 anos.

Nesta manhã, muitos pacientes tiveram que voltar para suas casas ou procurarem atendimento médico em outras unidades de saúde. O motivo é a falta de médicos e enfermeiros para o atendimento no Hospital Albert Schweitzer.

No fim da noite deste domingo, o filho da auxiliar de serviços gerais Valeira da Silva Pereira, 43, sofreu um acidente de moto na Vila Kennedy. Levado para o Albert Schweitzer, o comerciante Lucas da Silva Zeferino, 19, só recebeu suturas e estava com sangramento em uma das macas improvisavas da unidade.

Após receber a informação que a filha de 5 anos não seria atendida, a dona de casa Lilian de Souza, 37, se desesperou. É que a pequena Marcela Vitória de Souza Azevedo está com febre, dores no corpo e na cabeça há mais de cinco dias e os médicos não conseguem diagnosticar o que a criança tem.

— Como que eles vão atender se não recebem? Eles não têm culpa. A culpa é do Marcelo Crivella. Eu saí de casa, na (comunidade) do Barata, (em Realengo), porque eu pensei que ela seria atendido. Cheguei aqui e disseram que é para eu dar dipirona para a minha filha. Não pegaram nem ela para saber o que ela tem — desabafa a mulher.

Após mais de cinco horas na unidade, a dona de casa seguiu para o Hospital Souza Aguiar, no Centro, para tentar atendimento.

Atendimento reduzido’

Segundo o técnico de enfermagem acorrentado, só há atendimento no Albert Schweitzer para pacientes que chegam em estado grave:

— O atendimento está muito reduzido. Os pacientes estão sendo remanejados para outras unidades no momento em que as ambulâncias ligam para cá pedindo vagas para internação. Estão oferecendo aqui o mínimo do mínimo. Só quem chega morrendo que será atendido — diz.

Almeida conta que sua mulher está sustentando a casa e os três filhos.

— Moro em Campo Grande, tenho três filhos (12, 14 e 22 anos) e apenas a minha mulher sustenta a casa. Para mim, isso é muito doloroso. No próximo dia 16 de dezembro, a minha filha vai fazer aniversário e eu não tenho dinheiro para comprar um bolo simples para cantar os parabéns para ela. É preciso urgentemente que o governo federal assuma a gestão da saúde no município. O prefeito Marcelo Crivella não está sabendo lidar com as vidas — desabafou.

Solidariedade

Colegas de trabalho de André Luiz levam comida e água para alimentá-lo, além de o apoiarem a todo o tempo. Eles dizem que Almeida era um excelente funcionário e um dos melhores técnicos de enfermagem da unidade de saúde. A população também chega a todo o tempo com comida para ele.

A pensionista Vilma Ferreira da Silva, 70, as 9h40, se juntou a André em um protesto na porta do hospital. Com um cartaz “Venho pedindo piedade. Saúde não pode ser neglicenciada”, a mulher relata que, no começo do mês, a sua irmã, Maria José da Silva Pereira, 76 anos, morreu sem que os médicos da Clínica da Família de Pedra de Guaratiba e outros hospitais do município fizessem um diganóstico.

— Saúde não pode ser neglicenciada. Vivemos sem sapatos, carne, mas a gente não vive sem saúde. Alguém tem que explicar isso. Está faltando tudo: remédio, salário. Eles não podem negligenciar os pacientes. Saúde não pode ser negligenciada. Sou pensionista aposentada, moro na Vila Valqueire e sinto na pele a falta de saúde. No começo da última semana, perdi a minha irmã por conta da falta de saúde do município. Os médicos mandavam as pessoas para casa porque não tinham condições de atendê-las — afirmou Vilma.

Saga por atendimento

Segundo Vilma, sua irmã passou por diversas unidades de saúde e a doença que ela tinha não foi descoberta.

— Ela foi atendida em Seropédica, em Campo Grande e em Pedra de Guaratiba. Chagávamos com ela, os enfermeiros a medicavam e a mandavam para casa. Ninguém quis interná-la porque não tinham condições. Ela era medicada na UPA de Campo Grande e na Clínica da Família de Pedra de Guaratiba, e eles (os médicos) não descobriram o que ela tinha. Eles só pediam exames, exames e exames — afirmou.

Nota do hospital

Em nota, a direção do Hospital Municipal Albert Schweitzer negou que o técnico de enfermagem André Luís Prazeres Almeida tenha sido demitido por protestar. Ele “foi contratado pelo Hospital Municipal Albert Schweitzer para uma vaga temporária, substituindo uma funcionária de licença. Seu contrato foi encerrado no momento em que o profissional de licença retornou do INSS”.

Ainda segundo a nota, “o técnico de enfermagem foi desligado pois a coordenação do setor recebia frequentemente avaliações negativas do referido ex-funcionário na Sala Vermelha, inclusive que se recusava a dar banho nos pacientes sob seus cuidados. Com o retorno da profissional e as constantes reclamações sobre o técnico de enfermagem, optou-se por encerrar o contrato, pensando no bem estar dos pacientes”. A nota diz ainda que a direção “recebe com estranheza a declaração do mesmo já que a sua rescisão está no prazo.”

Por: Rafael Nascimento de Souza

EXTRA

 

Deixe uma resposta