Carroças com tração animal continuam a circular em Campos como querem

“Eu amo a minha profissão, nasci em cima de uma carroça e com ela que mantenho a mim e a minha família”. A afirmação é de Helivelton de Almeida, de 37 anos, que trabalha desde os 14 anos como carroceiro. Atualmente dois animais o auxiliam na tarefa: o cavalo Alecrim e o burro Triunfo. A atividade que ele realiza é objeto de um projeto de lei municipal, apresentado na última semana, que quer complementar uma lei estadual que proíbe a utilização de uso de tração animal no estado do Rio de Janeiro publicada em 2016, mas que até o momento não tem tido aplicabilidade em Campos. Diante da possibilidade de proibição da circulação deste tipo de veículos, um grupo de carroceiros interditou um trecho da BR 101, em Campos, em uma manifestação, na manhã da última segunda-feira (11). A vereadora que propôs o projeto, Marcelle Pata, afirma que município deve atuar para cumprimento da lei e evitar o sofrimento animal.

— O nosso projeto prevê a proibição de utilização de carroças no município, além de multas para quem contratar o serviço e cassação do alvará [de funcionamento] para estabelecimento comerciais. Ela obriga a prefeitura a dar uma opção de trabalho para os carroceiros, os animais serão encaminhados para ONGS, CCZ e também para a adoção responsável. O projeto Cavalo de Lata, elaborada por uma ONG nacional, fala ainda que a cidade compra os veículos. A ideia é que a prefeitura execute o mais rápido possível esse projeto é uma troca. É o fim do sofrimento animal pela a troca de um outro trabalho para os carroceiros — defende a vereadora.
Os carroceiros afirmam que os animais não sofrem maus-tratos e que medida vai acabar com a manutenção de renda de suas famílias.
— Eu estou trabalhando desde às 5h30 e agora estou aqui dando banho neles, colocando ração. Fui criado em cima de uma carroça e tenho muito apego a eles. O CCZ tem que atuar em caso de maus tratos, mas acreditar que todo mundo que trabalha como carroceiro trata mal os animais é um absurdo. Nós cuidamos muito bem porque devemos a eles o nosso sus-tento, e temos consciência disso — afirmou Helivelton.
Durante a manifestação a afirmação também foi dita por participantes. “Um carroceiro come-teu maus tratos, aí por causa de um, mais de 2 mil famílias vão ter que pagar pelo erro dele? Eu acho isso injusto. Se a gente for comprar um caminhão fica caro, porque a gente tem que pagar IPVA, pagar o caminhão. Aqui, ninguém tem condições de comprar um caminhão e nós gostamos dos animais. A gente cuida de todos eles. Ninguém aqui quer cavalo de lata e pronto. Tem um rapaz que é carroceiro, que até chorou, porque não sabe como vai viver sem esse trabalho, com filho novo para criar”, disse Alex Arrojado, 33 anos e carroceiro há 16, durante a manifestação ocorrida na última segunda, quando, aproximadamente 15 carroças foram colocadas no km 66 da rodovia. Equipes da Polícia Militar, da Polícia Rodoviária Federal e da Arteris Fluminense, concessionária que administra a BR 101, foram enviadas para o local. Às 11h, havia engarrafamento de um quilômetro em cada sentido, segundo a concessionária que administra a rodovia. Os manifestantes jogaram pneus e entulhos no meio da pista e atearam fogo.
Estado não definiu órgão fiscalizador
A lei já em vigor determina que órgãos estaduais se reservem a fiscalização da lei. No art. 1º, diz que “será responsabilizado todo indivíduo que utilizar animais para situações de freta-mento, transportes de cargas, materiais ou pessoas, nas áreas urbanas e rurais, por quais-quer atos que caracterizam maus tratos aos mesmos”. Diz ainda que fica instituída a responsabilidade do poder público em tomar as devidas providências como recolher os animais utilizados em transporte de cargas, materiais ou pessoas que sofram maus tratos por parte de seus donos e/ou usuários.
“A lei não fala de penalização, ela determina o recolhimento dos animais que estejam sofrendo maus tratos. A lei também é genérica quanto aos órgãos de fiscalização. As denúncias devem ser encaminhadas ao Ministério Público Estadual, que é o fiscal da Lei, para conceituação do que a própria lei considera maus tratos com os animais”, afirmou a nota enviada na ocasião.
O IMTT disse que “trata-se de uma lei estadual que proíbe veículos de tração animal, com exceção de áreas rurais e turística, tendo o município de Campos estas duas vertentes: rural e turística”, disse em 2016.
No Congresso, outro projeto é discutido
Um projeto de lei federal também quer proibir o uso de veículos de tração animal em área urbana e a sua substituição por veículo de propulsão humana. Proposto na Câmara dos Deputados pelo deputado Giovani Cherini (PDT-RS), o projeto fala sobre a circulação de carroças na área urbana de municípios com mais de 80 mil habitantes. Conforme a proposta, os catadores de material reciclável deverão substituir as carroças utilizadas em seu trabalho por veículos de propulsão humana, como bicicletas. Para comprar o meio de locomoção substituto, o governo dará aos trabalhadores uma linha de crédito especial.
Antes da troca, cada catador terá de ser cadastrado pelo órgão competente e encaminhado para cursos de capacitação profissional que incentivem a formação de cooperativas e associações. “A melhoria das condições de vida dos carroceiros, dos seus familiares e desses animais de tração é imprescindível”, afirma o parlamentar.
Além disso, Cherini destaca que os cavalos e similares são maltratados, “andando horas sem comer, beber ou descansar, carregando peso superior ao recomendado” e sem assistência veterinária.
O deputado acrescentou que nas cidades do interior, normalmente com população inferior a 80 mil moradores, é comum as famílias usarem carroças para se deslocar e trabalhar, razão pela qual seria inviável aplicar a proibição do uso desse meio de transporte nessas localidades.
A proposta, que tramita em caráter conclusivo, será analisada pelas comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público; de Desenvolvimento Urbano; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
CAMILLA SILVA 
Folha 1

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