No pais da sacanagem justiça toma nova decisão e manda recolher temática LGBT de Bienal
Decisão, que atende ao pedido da Prefeitura do Rio, foi assinada pelo presidente do TJ-RJ, desembargador Cláudio de Mello Tavares.
Uma decisão do TJ-RJ, assinada pelo presidente do tribunal, desembargador Cláudio de Mello Tavares, manda recolher as obras da Bienal que tratem de temática LGBT voltadas para o público jovem e infantil, que não estejam com embalagem lacrada e com advertência para o conteúdo, sob pena de apreensão dos livros e cassação de licença.
O desembargador afirma que a decisão não traz “impedimento ou embaraço à liberdade de expressão, porquanto, em se tratando de obra de super-heróis, atrativa ao público infanto-juvenil, que aborda o tema da homossexualidade, é mister que os pais sejam devidamente alertados, com a finalidade de acessarem previamente informações a respeito do teor das publicações disponíveis no livre comércio, antes de decidirem se aquele texto se adequa ou não à sua visão de como educar seus filhos”.
A decisão atende a recurso da Prefeitura, e suspende uma liminar obtida pela organização da Bienal 2019, que impedia as autoridades municipais de buscar e apreender obras em função de seu conteúdo, “notadamente” aquelas que tratam de conteúdo LGBT.
Na quinta-feira, o prefeito do Rio, Marcelo Crivella, pediu para recolher exemplares do romance gráfico “Vingadores, a cruzada das crianças” (Salvat), que tem a imagem de um beijo entre dois personagens masculinos. Os livros eram vendidos lacrados, e a capa não tem nenhuma imagem de conteúdo erótico.
A Bienal do Livro Rio informou que vai recorrer da decisão do presidente do Tribunal de Justiça do Rio no Supremo Tribunal Federal (STF), “a fim de garantir o pleno funcionamento do evento e o direito dos expositores de comercializar obras literárias sobre as mais diversas temáticas – como prevê a legislação brasileira.”
“Consagrada como o maior evento literário do país, a Bienal do Livro reafirma a manutenção da programação para o fim de semana, dando voz a todos os públicos, sem distinção, como uma democracia deve ser. Este é um festival plural, onde todos são bem-vindos e estão representados. Autores, artistas, pensadores e acadêmicos do Brasil e exterior têm participado de inúmeros painéis sobre os mais variados temas, como fé, fake News, felicidade, ciências, maternidade, teatro, literatura trans, LGBTQA+ e muito mais. Além de todo um pavilhão dedicado às crianças, com contação de histórias, lançamento de livros e espetáculos circenses”, escreveu a organização da feira.
Capa do livro “Vingadores – A Cruzada das Crianças” — Foto: Divulgação
“Vingadores, a cruzada das crianças” tem autoria de Allan Heinberg e Jim Cheng. A obra aborda a equipe dos Jovens Vingadores. Dela, fazem parte os personagens Wiccano e Hulkling, que são namorados. A edição que estava na Bienal data de 2016 e estava sendo oferecida em “saldões” do evento.
Após Crivella ter determinado o recolhimento dos livros, a Prefeitura citou cumprimento do Estatuto da Infância e do Adolescente (ECA) e ameaçou cassar a licença da Bienal.
“Livros assim precisam estar em um plástico preto, lacrado, avisando o conteúdo”, disse o prefeito em vídeo nas redes sociais.
O ECA, porém, não menciona a homossexualidade como indicativo de que uma obra deva ser considerada imprópria.
De acordo com o inciso quatro, artigo 5º, da Constituição Federal, “é livre a manifestação do pensamento”. E segundo o inciso 9, do mesmo artigo, é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.
Silvana do Monte Moreira, presidente da Comissão dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-RJ, afirmou: “A prefeitura não tem o poder de busca e apreensão. Este poder é, estritamente, do Judiciário. Desde 2011, a família homoafetiva é reconhecida. Nós sabemos disso, foi amplamente divulgado. Em 2019, a homofobia tornou-se crime, equiparado ao racismo”.
Livros estavam lacrados, segundo a Bienal
A Bienal informou que os exemplares de “Vingadores, a cruzada das crianças” já estavam lacrados, como todos os livros de edição especial que vêm embalados em plástico transparente. Eles não ficam abertos para que o público possa “folhear”.
Foto de livro criticado por Crivella na Bienal do Rio — Foto: Wilton Junior/Estadão Conteúdo
Por G1 Rio