Um imbróglio judicial deixou o Hospital dos Plantadores de Cana (HPC) ameaçado de ficar sem energia elétrica a partir desta semana. Responsável pelo fornecimento, a Enel Distribuição Rio divulgou nota, na manhã desta segunda-feira (24), informando que cortaria a luz da unidade filantrópica em virtude de uma dívida superior a R$ 20 milhões, fruto de contas vencidas há mais de 20 anos. A quantia foi negada por Frederico Paes, diretor presidente do HPC desde 2012, com base em decisão judicial. No final da tarde, o juiz Paulo Maurício Simão Filho, da 3ª Vara Cível de Campos, emitiu uma liminar impedindo o corte, sob pena de multa diária de R$ 10 mil, limitada a R$ 100 mil. Uma audiência de conciliação foi marcada para o dia 13 de novembro.
Em sua nota, a Enel informou que “vem tentando há anos negociar o débito, sem sucesso. O hospital foi notificado há um mês sobre o desligamento do prédio da rede da distribuidora por inadimplência, mas ainda não se manifestou em relação ao pagamento ou negociação da dívida de forma efetiva”. Segundo a concessionária, o Sistema Único de Saúde (SUS), a Prefeitura de Campos, a secretaria municipal de Saúde e o Ministério Público (MP) foram comunicados sobre o corte, que ocorreria nesta semana. A Enel ficou de assumir, durante uma semana após a interrupção do fornecimento de energia, os custos de geradores, no objetivo de dar tempo para a remoção de pacientes do hospital.
O presidente do HPC disse ter ficado surpreso com o posicionamento da Enel. Frederico Paes enviou à reportagem uma ata de reunião ocorrida no último dia 20 de julho, envolvendo diretores do hospital e representantes da fornecedora de energia. Nela, consta uma proposta da Enel para que o HPC pagasse as contas com vencimento a partir de 25 de julho deste ano, viabilizando assim uma negociação para a quantia total ser parcelada a partir de janeiro de 2019. As contas de agosto e setembro foram pagas, nos valores de R$ 82.020,53 e R$ 76.066,65, respectivamente. Porém, não foi cumprida a promessa da Enel de suspender as ações.
Em agosto de 2017, o desembargador Luiz Fernando de Andrade Pinto, relator do processo, reconheceu o excesso de cobrança. “No momento que a Justiça falar que o valor devido é X, nós vamos começar a pagar o débito. A perícia ainda não foi feita. O mais importante é que o hospital não nega a dívida. O que a gente nega é valor cobrado. Não tem como fazer acordo em cima de um valor que a própria Justiça fala que está errado”, disse o presidente do HPC. Segundo ele, a unidade tem, atualmente, mais de 150 pacientes internados, 98% deles pelo SUS. Entre os pacientes, há recém-nascidos e idosos nas Unidades de Tratamento Intensivo (UTI’s).
Na decisão proferida, o juiz Paulo Maurício Simão Filho entendeu que não se justificava o corte, que “acarretaria risco de morte para vários de seus pacientes, mormente em se tratando de débitos pretéritos, cujo pagamento a parte ré pode buscar por outros meios”.
Repasses atrasados
Enfrentando dificuldades financeiras há vários anos, o HPC recebe atualmente cerca de R$ 1 milhão mensal em repasses do SUS e da Prefeitura de Campos. Frederico Paes disse que os repasses atuais estão em dia, mas a gestão anterior do município deixou uma dívida de R$ 7 milhões, que está sendo negociada com a atual gestão.
Foi citado na nota da Enel que, em junho deste ano, “o hospital concluiu uma grande reforma, com a inauguração de um novo Centro Médico”. A unidade conta ainda com ar-condicionado central, catracas de acesso e totens de atendimento eletrônicos, diversas TV’s de LED e carregadores de celular espalhados pela recepção”. Frederico Paes classificou a nota como absurda: “Só porque a população é carente, do SUS, não pode ter direito a um ar-condicionado, conforto, dignidade no atendimento? Só porque é pobre tem que ficar no calor? Não concordamos com isso. É um absurdo essa declaração”.
Em nova nota, já na parte da tarde, mas antes da liminar, a Enel alegou que o hospital não apresentou nenhuma proposta para pagamento da dívida. “O pagamento das faturas correntes é uma obrigação de qualquer cliente e a quitação das contas de agosto e setembro não configura proposta de acordo. O valor de R$ 20 milhões de dívida, que está sendo oferecido como proposta de acordo pela Enel, é ainda menor do que o valor definido pela Justiça, que alcançaria R$ 28 milhões (devido a correções e índices do Tribunal de Justiça)”, diz um trecho da nota. Ainda segundo a Enel,” a administração do hospital está se recusando a receber os equipamentos (geradores) e vem impedindo o acesso dos técnicos da Enel às dependências da unidade. Para garantir que os geradores estejam disponíveis e sejam instalados, a companhia está tentando autorização junto à Prefeitura, para utilizar espaço da via pública”.