PGR questiona TSE sobre disparidade entre cota e recursos para mulheres
Para Raquel Dodge, legislação que limita em 15% o teto de gastos com candidaturas femininas é inconstitucional e reforça distorção histórica
Se a legislação determina a reserva de 30% das candidaturas para mulheres, como pode outra regra limitar entre 5% e 15% o valor do fundo partidário destinado ao financiamento dessas candidaturas? A partir deste questionamento, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, consultou, neste Dia Internacional da Mulher, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sobre a interpretação da Corte acerca da Lei 13.165/2015 que, segundo ela, promove disparidade de gênero na distribuição de verbas eleitorais. No documento, há ainda um pedido para que a vigência da medida que estabelece a cota financeira não fique restrita a cinco anos.
A previsão legal é objeto de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade apresentada pela PGR ao Supremo Tribunal Federal (STF), que deve ser julgada em 15 de março. Na consulta formalizada nessa quinta-feira (8), Raquel Dodge, que é procuradora-geral Eleitoral, apresenta argumentos contrários à limitação para utilização dos recursos do fundo partidário nas candidaturas femininas.
“Em vez de estabelecer discriminação positiva suficiente para garantir igualdade, esta lei estabeleceu evidente distorção que, ademais, avança de forma irrazoável e ilegítima sobre a autonomia de organização dos partidos políticos”, enfatiza.
No documento – endereçado ao presidente do TSE, ministro Luiz Fux – Raquel Dodge destaca que os limites impostos pelo artigo 9º da Lei 13.165/2015 fragilizam o princípio constitucional da igualdade e reitera que é preciso equiparar o percentual destinado a vagas com os recursos financeiros. “Parece evidente, por qualquer senso de justiça e adequação, que a proporção mínima do fundo partidário destinado à candidatura de mulheres deve ser coerente com a quantidade mínima de vagas a elas reservadas”, assevera no texto.
Além de apontar a injustiça dos limites de verba, Raquel Dodge questiona a insuficiência de tempo de vigência prevista pela norma, de 2015. “Cinco anos (ou duas eleições municipais e uma eleição nacional) não é tempo suficiente para alterar desigualdade histórica de gênero que se reflete na baixa presença de mulheres na política”, escreve. Segundo ela, a reserva de 30% das vagas para candidatas “tem seu potencial transformador esvaziado quando não acompanhada de correspondente reserva de recursos financeiros pelos partidos, fixada por tempo suficiente a provocar transformações estruturais da sociedade”, explica a PGR no pedido.
Evento magistratura
A decisão de apresentar a consulta ao TSE foi anunciada pela PGR na noite de quarta-feira (7), durante a abertura do 2º Seminário Mulheres no Sistema de Justiça: Trajetórias e Desafios, promovido pela Associação do Juízes Federais (Ajufe). “Como podem recursos públicos terem piso, quando este piso é aquém da proporção que dá dinheiro para as candidaturas masculinas? Trinta por cento para as candidaturas femininas e 70% para homens é o mínimo que pode ser garantido”, enfatizou durante discurso no evento.
Ainda durante a abertura do seminário, a procuradora-geral fez um relato da evolução histórica dos movimentos feministas ao longo dos últimos 100 anos. Mencionou desde a luta pelo direito ao voto até a mobilização atual que, em sua avaliação, tem como propósito a defesa de direitos humanos.
“Aquele movimento sufragista que teve início no século XX é um movimento que não se completou. A capacidade de a mulher de se tornar representante do povo ainda depende de uma lei de cotas que ao invés de estabelecer piso mínimo, estabeleceu teto, e, por isso, merece a reflexão de todos para uma solução legal compatível com a igualdade que a Constituição assegurou”.
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