Em poucas palavras, entenda a situação financeira da Venezuela

FRANCISCO TORO*

Um amigo me enviou uma foto que conta uma poderosa história sobre a situação vivida pelos venezuelanos, no caso os pobres que ainda não fugiram para o Brasil e Colômbia, e os que, com algum dinheiro, migraram para Espanha e EUA. Na verdade, não é uma imagem muito boa, apenas uma foto de lixo: algum material de embrulho, um CD antigo – detritos deixados para trás depois que uma loja foi saqueada  em San Felix, que junto com Puerto Ordaz forma a Ciudad Guyana, no sudeste do país.

No entanto, não consigo parar de pensar nisso, porque, no meio do lixo, havia pelo menos cinco notas de 100 bolívares, moeda de denominação tão pequena agora, tão inútil, que nem mesmo os saqueadores acharam que valia a pena parar e recolhe-las. Em teoria, de acordo com a taxa “oficial” de câmbio, que há muito tempo perdeu o menor toque de conexão com a realidade, cada uma dessas notas vale US$ 2. Na verdade, à medida que a Venezuela afunda cada vez mais profundamente na hiperinflação, a primeira que o Hemisfério Ocidental vê em uma geração, 1 bolívar passou a valer basicamente nada: cerca de US$ 0,0001 à taxa de câmbio atual, o que significa que é preciso ter 100 delas para igualar um centavo. Parte superior do formulário

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É fácil ver porque os ladrões as deixaram para trás.

A hiperinflação desorienta. Cinco ou seis anos atrás, os 500 bolívares no chão teriam comprado uma refeição para dois, com vinho, no melhor restaurante de Caracas. No final do ano passado, eles teriam comprado pelo menos uma xícara de café. Hoje, eles compram basicamente nada. . . bem, com exceção de 500 litros da gasolina mais extravagantemente subsidiada do mundo.

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Foto:O POVO Online

Isso é muito difícil de compreender quando nunca se passou por uma hiperinflação. Nela, parece que os preços estão aumentando rapidamente, mas não estão. Na verdade, o dinheiro está desmoronando. Sob a hiperinflação, o dinheiro não funciona mais. Não armazena valor. Apenas deixa de fazer as coisas básicas que as pessoas esperam que o dinheiro faça. Ele deixa de ser algo que a pessoa deseja e se transforma em algo pela qual ela fará qualquer coisa possível para evitar ter em mãos. Algo tão sem valor que ela nem se inclina para pegar do chão ao participar de um saque.

Na hiperinflação há duas regras vitais. Regra número 1: para sobreviver à hiperinflação é preciso livrar-se do dinheiro. Dada a velocidade com que ele perde seu valor, mantê-lo significa perder poder de compra. Regra número 2: recebeu o dinheiro? Corra o mais rápido possível para comprar algo – qualquer coisa – enquanto ainda possa pagar. É melhor manter qualquer outro ativo que não seja dinheiro, porque os ativos possuem seu valor e o dinheiro não.

Encontrou uma lata de atum? Compre. Mesmo que você deteste atum. Mesmo que você não tenha intenção de comer atum. Você sempre poderá trocá-lo por algo mais tarde. O atum mantém seu valor. O dinheiro não.

*O autor é jornalista do The Washington Post.

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