Músico falou em SP sobre turnê com tom político que vai no início de 2018 à Europa e em outubro ao Brasil. Ele explicou posição pró-Palestina e contra Trump e ‘direita sionista cristã raivosa’ dos EUA: ‘Querem destruir a Terra’.
Por Rodrigo Ortega, G1
Roger Waters durante série de entrevistas em São Paulo nesta sexta-feira (8) (Foto: Divulgação / Time For Fun / MRossi)
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Aos 74 anos, Roger Waters não foge de brigas. O ex-líder do Pink Floyd vai trazer em outubro de 2018 ao Brasil uma turnê com alta carga política, com antigas músicas da banda e do álbum Is “This the Life We Really Want? (2017)”. Donald Trump, presidente dos EUA, é um alvo especial de críticas no disco e na turnê.
Waters participou de entrevista coletiva em São Paulo nesta sexta-feira (8) sobre o show que vai trazer ao país. Mas as tentativas de falar sobre detalhes do espetáculo e do repertório foram frustradas: ele queria mesmo explicar as inspirações políticas do seu trabalho.
O músico conhecido por sua posição pró-Palestina e por insistir para que músicos não toquem em Israel não gostou, claro, de o governo de Trump ter reconhecido na quinta-feira (7) Jerusalém como capital israelense – contrariando os palestinos e o resto do mundo.
A “direita sionista cristã raivosa” dos EUA quer “destruir a Terra”, segundo Roger Waters. O músico não mede palavras – e também acredita em reações fortes contra ele.
“Sei que vou enfrentar uma grande batalha na Europa [onde tocará no ano que vem]. Porque os israelenses vão tentar me matar. Não literalmente, provavelmente, embora eles possam fazer isso também. Eu não ficaria surpreso. Eles são bem estranhos. Mas eles vão me atacar com a toda a voracidade deles para me descreditar”, disse.
Veja os principais trechos da entrevista. mas antes, um Trailer do Pink Floyd:
A divisão entre as pessoas é o tema central de sua música. Essa turnê fala muito disso. Ao contrário do que muita gente previa, hoje estas divisões estão crescendo e ficando mais violentas. Por que isso acontece? Acha que o rock e a música pop podem ajudar nisso?
Roger Waters – Isso acontece porque os poderosos sempre roubaram dos sem poder. Esperávamos que isso diminuísse depois da Primeira Guerra depois da formação da Liga das Nações. E depois da Segunda, com a formação das Nações Unidas e a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Há um fórum para expressar os sentimentos dos povos. Mas nada muda. Por quê? Todo mundo continua corrupto. Por que isso acontece? Todos vivemos, especialmente vocês aqui no Brasil, as consequências de séculos de colonização. Oprimiram não só os povos indígenas brasileiros, mas todos os escravos que trouxeram.
Há um motivo para isso. Velhos hábitos demoram a morrer. Algumas pessoas acham que são especiais e que têm o direito de mandar no mundo e roubar tudo. É difícil para elas acharem que há algo errado com isso. Talvez todos os seres humanos devessem ter direitos iguais. Mas eles não acreditam nisso.
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A turnê passou 2017 pelos EUA, com várias referências ao presidente deles. Você vai adaptar isso em 2018, em shows no resto do mundo?
Eu já editei uma nova versão [do vídeo] da música “Money”, agora não é só sobre Trump e Putin. Vou adicionar Theresa May, Macron e líderes da Europa, porque vamos tocar lá. Eu adoraria fazer um show diferente para cada lugar, sobre cada problema local, político, discriminação e etc, mas é impossível. Confesso que não tinha pensado na América do Sul ainda. Estou pensando na Europa.
Roger Waters em São Paulo (Foto: Divulgação / Time For Fun / MRossi)
Sei que vou enfrentar uma grande batalha na Europa. Porque os israelenses vão tentar me matar. Não literalmente, provavelmente, embora eles possam fazer isso também. Eu não ficaria surpreso. Eles são bem estranhos. Mas eles vão me atacar com a toda a voracidade deles para me descreditar
Mas esse é um problema lateral em relação à ideia dessa turnê, que é: nós somos todos seres humanos. Provavelmente todos temos origens africanas, o mesmo DNA. Temos que aceitar a ideia de que somos todos irmãos e irmãs. E que temos uma responsabilidade de ajudar irmãos e irmãs nessa família.
Uma das responsabilidades que temos é fazer o exato oposto do que os governantes nos pedem. Temos a responsabilidade absoluta de não competir uns com os outros. Temos que cooperar além de fronteiras nacionais, ou de fronteiras de raça, cor, religião…
Todas essas fronteiras desaparecem se pensarmos que estamos destruindo o planeta em que nossas crianças vão viver pelos próximos anos. Por isso o governo Trump entra em qualquer conversa: eles estão determinados em acelerar a destruição da Terra. Seja numa guerra nuclear ou na catástrofe de não prestar atenção nas mudanças climáticas. Não importa, os dois são fatais.
Esse governo é inacreditável. A secretária de Educação Betsy DeVos e o vice-presidente Mike Pence, os dois são da direita sionista cristã raivosa. Eles estão esperando pelo arrebatamento [a volta dos cristãos para o céu, com a segunda vinda de Jesus Cristo, acontecimento que alguns evangélicos acreditam estar ligado ao estabelecimento do povo judeu].
Eles acreditam porque seus avós leram sobre isso na Bíblia. Eles creem que isso está chegando, e querem que chegue. Eles estão encorajando isso de todas as maneiras que podem. Betsy DeVos disse claramente que vai instituir o ensino religioso da criação do mundo como ciência nas escolas públicas. Como assim?
Mais um pouquinho da maior banda de Rock de todos os tempos:
Você já veio para cá nas turnês de ‘Dark side of the moon’ e ‘The wall’. E agora toca essas músicas junto com um disco novo. Como conectar estes discos com essa nova mensagem?
Já falei sobre tudo isso antes. O show é sobre esses babacas têm o pé na nossa garganta. Eles não se importam com a vida humana, com nossos filhos, ou uma criança em Aleppo.
Desde 2001 os EUA já mataram 4 milhões de pessoas no Oriente Médio. É um começo. Quantos muçulmanos há no mundo? Três ou quatro bilhões. Eu estou certo de que se eles mantiverem a fábrica funcionando… Quanto tempo pode levar para matar alguns bilhões de pessoas?
Especialmente depois de ontem. Todo muçulmano no mundo ficou mortalmente ferido pelo anúncio de Trump ontem. Eu sou um ateísta radical. Mas eu entendo as pessoas que não são. Elas muito apegadas a seus lugares sagrados, porque isso é importante.
Você sabe que uma versão de ‘Another brick in the wall’ é um jeito de xingar pessoas em estádios e protestos políticos pelo Brasil? Trocamos ‘teacher’ pelo nome do inimigo. O que acha dessa apropriação?
Amei isso. Não tinha ideia. Fico feliz com isso. “Finalmente!” (diz em português).